Depoimento pessoal: Jackeline e os obstáculos do desenvolvimento

08/01/2016 às 12:413 min de leitura

Que toda família tem suas histórias é inegável. “Causos” mais tristes, outros mais felizes e aqueles mais inspiradores fazem parte de vida de cada pessoa viva. Richard Dawkins, famoso evolucionista, considera sortudos todos aqueles que vão morrer — porque, afinal, para isso, eles tiveram de nascer, e a quantidade de pessoas que nunca verão a luz do dia ultrapassa o número de grãos de areia do Saara.

O que dizer de uma pessoa que possui problema de deficiência física congênita nascida em uma família sem muitos recursos ou possibilidades de auxílio que, contra todas as expectativas da Ciência e auxiliada por profissionais extremamente competentes — e outros nem tanto —, supera dificuldades consideradas insuperáveis? Hoje vou contar a história do nascimento e do crescimento de minha irmã, Jackeline Julieta Franco Zaruvni. Ela merece ter sua vida contada.

Em 7 setembro de 1988, Beatriz Franco Zaruvni foi a mais uma consulta pré-natal de rotina, preocupada inclusive pelo fato de não ter dado à luz a filha, primogênita — haviam se passado alguns dias da data prevista e os sinais de nascimento insistiam em não aparecer. Após breve exame, constatou-se que, devido a uma lesão óssea, não haveria contrações e que o líquido amniótico estava no fim, causando sérios riscos ao bebê.

Após a cirurgia, a mãe não pôde ver o bebê. O motivo foi descoberto depois: havia nascido com a perna esquerda virada para trás, ao contrário. Além disso, constatou-se a possibilidade de hidrocefalia, o que poderia comprometer o desenvolvimento da criança.

Tendo um diagnóstico nada promissor e sabendo que Jackeline, o bebê, poderia depender sempre de assistência enquanto viva, em vez de aceitarem o fato, Beatriz e Reinaldo Zaruvni, nosso pai, empreenderam uma corrida contra as probabilidades da medicina. Aos 3 meses, a primeira de muitas cirurgias seria realizada — visando, principalmente, corrigir o problema da perna. As consultas com psicólogos e idas a fisioterapias também ser tornaram uma constante na vida da família.

Jackeline Julieta Franco Zaruvni, quando criança, se recuperando de intervenções cirúrgicas

Em uma das intervenções, um problema. Devido a um erro médico, o tendão de Jackeline foi prejudicado, o que afetou, inclusive, o desenvolvimento natural de crescimento do membro. Ainda assim, a luta continuou e outro médico assumiu o caso, prometendo fazer o máximo que poderia por um caso raro de possibilidade de recuperação em uma situação tão grave.

Então, com mais ou menos um ano e meio de idade, o desenvolvimento cognitivo de Jackeline “estacionou”; ela precisava de alguém em quem se espelhar. Foi aí que nasci. Juntos, aprendemos a falar, andar e brincar. Os médicos sempre se surpreenderam com o que todos os fatores combinados puderam fazer por um paciente, o que não significou, entretanto, ter sido um processo fácil de ser desenvolvido. Afinal, há muito preconceito no mundo ainda, e estamos falando de uma menina com deficiência física, problemas cognitivos e cujo suporte escolar, depois de um tempo empreendido na Associação Paranaense de Reabilitação — APR, era o de uma escola pública que, mesmo com classe para alunos especiais, carecia de estrutura para atender casos como esse.

Já adulta, superou inúmeros obstáculos

Após inúmeras cirurgias e anos de acompanhamento e terapia, Jackeline, tendo terminado seus estudos no Ensino Fundamental de maneira convencional, trabalha, continua estudando e é uma das pessoas mais batalhadoras que conheci. Tem uma inclinação única para apreciar obras de arte, preferindo as coloridas, e não dispensa a leitura de um livro de poesia ou outro. Sua perna, com suas inúmeras cicatrizes e, certamente, dores, se tornou funcional e, mais do que isso, propiciou, a ela, uma vida praticamente normal — quem enfrenta ônibus todo dia sabe como é difícil mesmo com membros saudáveis.

De meus pais, nem tenho o que comentar. Eles são verdadeiros heróis que, mesmo com todos os problemas que a vida jogou em suas cabeças, não hesitaram diante de um desafio e criaram dois filhos prontos para enfrentar as próprias histórias, dores e reveses. Às vezes, bastam um pouco de persistência, loucura e vontade de vencer.

Portanto, através das figuras de Jackeline, Beatriz e Reinaldo, é possível perceber que um destino complicado pode ser uma história de sucesso e superação. Portanto, se há algum problema, não abaixe a cabeça: lute sempre! Como diz minha mãe, sendo honesto e determinado, se vai ao longe. Minha irmã, sobretudo, já foi e promete ir mais além.

Voltando a Richard Dawkins, somos todos privilegiados que foram sorteados na loteria do nascimento contra todas as probabilidades. Jackeline é, afinal, mais uma contemplada.

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