Como a culpa consumiu Henry Rathbone?

08/05/2020 às 14:004 min de leitura

O Ford Theatre, localizado em Washington (Estados Unidos), estava com os seus 1,7 mil assentos ocupados naquela noite. Da plateia lotada, só vinha o coro de risadas dos espectadores que assistiam a peça Our American Cousin, escrita pelo dramaturgo Tom Taylor. Era 15 de abril de 1865 quando John Wilkes Booth invadiu o camarote onde o presidente Abraham Lincoln estava assistindo ao espetáculo e disparou um tiro contra a cabeça dele. A data, então, entrou para história mundial.

A bala atravessou a parte de trás do crânio de Lincoln, movendo-se pelo cérebro até se alojar acima do olho direito. O presidente sequer chegou a sentir o que aconteceu de tão rápido que ele perdeu a consciência. O seu assassino fugiu a cavalo da cena do crime.

A maioria das pessoas conhece a narrativa fatídica daquele dia, do assassinato à perseguição de 12 dias pelo paradeiro de Booth. Porém, poucos sabem sobre a assombrosa história de Henry Rathbone, o major que estava sentado bem atrás do presidente e que falhou em salvá-lo.

O começo do fim

(Fonte: Crime Not Forgotten/Reprodução)(Fonte: Crime Not Forgotten/Reprodução)

Em Albany (Nova York), nasceu Henry Reed Rathbone no dia 1 de julho de 1837 — o filho do empresário Jared Rathbone e de Pauline Rathbone. O patriarca da família morreu quando Henry tinha apenas 8 anos e deixou uma fortuna milionária para o filho e esposa. No ano de 1848, a mulher casou-se com Ira Harris, o juiz da Suprema Corte de Nova York, um viúvo que tinha uma filha, Clara Harris.

Com o passar do tempo e morando na mesma casa, Henry e Clara não só passaram a dividir uma vida como também a desenvolver sentimentos um pelo o outro. Naquela época, a sociedade não achava tão estranho que um relacionamento romântico nascesse entre ambos, mesmo após uma convivência como "meio-irmãos".

Rathbone se formou em Direito pela Union College e chegou a exercer a profissão por um curto período, ingressando no Exército da União no início da Guerra Civil. Ele serviu como capitão no 12º Regimento de Infantaria, atuou na Batalha de Antietam e na de Fredericksburg. Foi só no final da guerra que ele alcançou o posto de major. Naquela altura, ele e Clara Harris já estavam noivos.

(Fonte: Find a Grave/Reprodução)(Fonte: Find a Grave/Reprodução)

Abraham Lincoln havia convidado o General Grant e sua esposa, Julia, para que se juntasse a ele e a primeira-dama, Mary Todd Lincoln, para assistirem à peça na noite em que perdeu a vida. Contudo, o General não pôde comparecer — o que foi conveniente, pois Mary Todd não se dava bem com a esposa do homem. A mulher então sugeriu ao marido que convidassem Clara Harris e seu esposo, visto que havia desenvolvido uma forte amizade com a mulher.

Quando o tiro de Booth interrompeu o espetáculo naquela trágica noite, Rathbone saltou imediatamente para conter o assassino, mas esse já estava preparado para qualquer reação. Booth puxou uma adaga e perfurou o major, abrindo um rasgo de seu ombro até o cotovelo, quase o atravessando com a lâmina.

Rathbone tentou uma última investida, o que causou apenas o desequilíbrio do assassino quando pulou a proteção do camarote e caiu no palco. O major desmoronou, sangrando profusamente, e foi amparado por Clara, que deitou a cabeça dele em seu colo. O homem gritava, delirando com a perda rápida de sangue e o fato de que foi incapaz de impedir o assassinato do presidente. Ali foi o começo de seu fim.

Cedendo à escuridão

(Fonte: Alchetron/Reprodução)(Fonte: Alchetron/Reprodução)

O major Henry Rathbone se curou de seus ferimentos, porém a sua saúde mental foi apenas piorando ao longo dos anos e de uma forma muito feroz. A culpa por não ter protegido Abraham Lincoln se tornou insuportável e estava sempre presente na mente do homem.

“Será que não fui rápido o suficiente?”; “Será que não fui forte o suficiente?”; “Como todos esses anos lutando em uma Guerra não me fizeram parar um mero ator?”. Rathbone havia sobrevivido aos ataques de tropas inimigas com milhares de soldados. Ele havia previsto ataques de canhão, granadas e bombas. Ele havia protegido um exército inteiro, mas falhou em proteger uma das pessoas mais importantes da nação.

Arruinado, o major delirava relembrando o momento do assassinato, que se repetia minuto após minuto em sua cabeça. A culpa cada vez mais adicionava um detalhe fantasioso à cena, aumentando o sentimento dele de fracasso e raiva. A loucura reforçava tudo, e a sanidade se tornou uma amiga fiel de suas paranoias.

Clara Harris não conseguiu lavar o sangue de seu vestido, porém, por algum motivo desconhecido, ela também não conseguiu se desfazer dele. Então, a mulher simplesmente o pendurou no guarda-roupas do quarto de hóspedes na casa de férias da família, em Nova York. Logo em seguida, ela ordenou que o armário fosse cimentado com uma parede de tijolos, escondendo nas sombras a lembrança física daquele dia nefasto que levou a sanidade de seu marido embora.

Em julho de 1867, Rathbone e Harris se casaram e tiveram 3 filhos. Em 1870, a família se mudou para a Alemanha assim que o major subiu ao posto de coronel, mas ele acabou renunciando ao exército no mesmo ano por conta de sua precária saúde mental, que dificultava ele ser designado a exercer qualquer trabalho.

A dama de sangue

(Fonte: Mr. Lincoln's White House/Reprodução)(Fonte: Mr. Lincoln's White House/Reprodução)

Nesse ínterim, Harris se esforçou para encontrar uma cura a Rathbone, porém a mente dele recusava absolutamente qualquer tipo de tratamento ou procedimento. Ela estava perdendo o marido cada vez mais rápido.

Entrando em um território instável, ou seja, a mente do homem que ela amava, a preocupação da esposa e suas tentativas de salvar o marido viraram contra ela. Do dia para a noite, Rathbone chegou à fantasiosa conclusão de que Clara era infiel e todo aquele esforço dela não passava de um plano para afastá-lo de seus filhos para sempre.

O tempo "devorou" a mente do homem com relação a isso, assim como a culpa pelo assassinato de Lincoln também. Até que no dia 23 de dezembro de 1883, Rathbone atingiu o seu ápice de fúria após ouvir de Clara que ela pediria o divórcio por conta das suspeitas que ele havia erguido contra ela.

Com um revólver e uma faca em mãos, Rathbone rumou para o quarto de seus filhos decidido a dar um fim em tudo aquilo. Clara foi alvejada por tiros e levou diversas facadas enquanto protegia as crianças da fúria do marido. Ela morreu em uma poça do próprio sangue no chão do cômodo. Rathbone, ainda mais perturbado pela cena, revivendo o assassinato do presidente, desferiu cerca de 6 facadas contra o próprio peito. Porém, ele sobreviveu.

Em tribunal, Henry Rathbone declarou que estava tentando defender a esposa contra um invasor e que inclusive ele mesmo acabou sendo golpeado no processo. O antigo coronel foi condenado a 28 anos de confinamento em um sanatório para criminosos que ficava em Hildesheim, na Alemanha.

Henry Riggs, Gerald Lawrence e Clara Pauline, os três filhos do casal, ficaram sob a custódia de parentes próximos. No dia 14 de agosto de 1911, aos 74 anos de idade, Henry Rathbone faleceu e foi enterrado no cemitério da cidade de Hanover, em solo alemão. Um ano antes, Henry Riggs, o filho mais velho, foi até a antiga casa de férias da família em Nova York, derrubou a parede dentro do guarda-roupas e queimou o vestido que guardava a memória do dia que amaldiçoou a mente de seu pai para sempre.

Em meados de 1952, os funcionários do cemitério de Hanover entenderam que os restos mortais de Henry Rathbone e Clara Harris estavam apenas ocupando sepulturas, uma vez que em anos o relatório não apontou nenhum visitante. O casal então foi exumado, tiveram os ossos queimados e as cinzas descartadas em algum local. Atualmente, é como se eles nunca tivessem existido.

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